Os novos espaços de atuação do professor com as tecnologias
José Moran
Orientador de Projetos Educacionais Inovadores
com metodologias ativas
nas modalidades presencial e a distância
Do livro “Novas Tecnologias e Mediação
Pedagógica”, Papirus, 21a ed, 2013, p. 27-29
As mudanças que estão acontecendo na
sociedade, mediadas pelas tecnologias em rede, são de tal magnitude que
implicam em reinventar a educação como um todo, em todos os níveis e de
todas as formas.
Não é suficiente ter um laboratório na
escola (quando existe) para um acesso esporádico durante algumas aulas. Hoje,
todos os alunos, professores e a comunidade escolar caminham para poder
aprender em qualquer espaço presencial e digital.
Hoje, o professor, em qualquer curso presencial,
precisa aprender a gerenciar vários espaços e a integrá-los de forma aberta,
equilibrada e inovadora, pois antes ele só se preocupava com o aluno em sala
de aula. Agora, continua com o estudante no laboratório (organizando a
pesquisa), na Internet (atividades a distância) e no acompanhamento das
práticas, dos projetos, das experiências que ligam o aprendiz à realidade,
à sua profissão (ponto entre a teoria e a prática) – e tudo isso fazendo
parte da carga horária da sua disciplina, estando visível na grade
curricular, flexibilizando o tempo de estada em aula e incrementando outros
espaços e tempos de aprendizagem.
Educar com qualidade implica em organizar e
gerenciar atividades didáticas em, pelo menos, quatro espaços.
1) Reorganização dos ambientes presenciais
A sala de aula como ambiente presencial
tradicional precisa ser redefinida. Até agora identificamos ensinar com ir
regularmente para este ambiente, mas aos poucos, ele se tornará um local de
começo e de finalização de atividades de ensino-aprendizagem, intercalado
com outros tempos em que freqüentaremos outros ambientes.
Como regra geral, nos encontraremos na sala de
aula para conhecermo-nos, organizar os procedimentos didáticos, motivar os
alunos, instrumentá-los sobre as etapas de pesquisa, sobre a alternância com
outros ambientes. Depois de um tempo maior ou menor, voltaremos a ela para a
apresentação dos resultados, para uma troca de experiências, para a
contextualização e generalização da aprendizagem individual e coletiva. E,
assim, iremos intercalando novas situações presenciais com atividades fora da
sala de aula.
Um computador em classe com projetor
multimídia é um caminho necessário, embora ainda distante em muitas escolas,
para oferecer condições dignas a professores e alunos. São poucos os cursos
até agora que fazem isso, mas se torna uma realidade cada vez mais premente se
queremos educação de qualidade.
O ideal seria as salas serem confortáveis, com
boa acústica e tecnologias, das simples até as sofisticadas; elas precisam
ter acesso fácil ao vídeo, DVD e, no mínimo, um ponto de Internet para
acesso a sites em tempo real pelo professor ou pelos alunos, quando
necessário. Com o avanço das redes sem fio e o barateamento dos computadores,
as escolas estarão conectadas e as salas de aula podem tornar-se espaços de
pesquisa, de desenvolvimento de projetos, de intercomunicação on-line, de
publicação, com a vantagem de combinar o melhor do presencial e do virtual no
mesmo espaço e ao mesmo tempo.
Outro ponto necessário é o uso de microfones
e amplificadores para professores que têm mais de 50 alunos, principalmente em
salas com acústica deficiente – para que não haja um desgaste excessivo.
O foco dos cursos presenciais e a distância
deve ser o desenvolvimento de pesquisa, fazer do aluno um parceiro-pesquisador.
Pesquisar de todas as formas, utilizando todas as mídias, todas as fontes,
todas as maneiras de interação. Pesquisar às vezes todos juntos, outras em
pequenos grupos, outras individualmente. Pesquisar na escola; outras, em
diversos espaços e tempos. Combinar pesquisa presencial e virtual. Relacionar
os resultados, compará- los, contextualizá-los, aprofundá-los,
sintetizá-los.
Mais tarde, depois de uma primeira etapa de
aprendizagem on-line, a volta ao presencial adquire uma outra dimensão. É um
reencontro tanto intelectual como afetivo. Já nos conhecemos, mas fortalecemos
esses vínculos; trocamos experiências, vivências, pesquisas. Aprendemos
juntos, tiramos dúvidas coletivas, avaliamos o processo virtual. Fazemos novos
ajustes. Explicamos o que acontecerá na próxima etapa e motivamos os alunos
para que continuem pesquisando, se encontrando virtualmente, contribuindo.
Os próximos encontros presenciais já trazem
maiores contribuições dos alunos, dos resultados de pesquisas, de projetos,
de solução de problemas, entre outras formas de avaliação.
2) Atividades nos ambientes presenciais
conectados
Um dia todas as salas de aula estarão
conectadas em rede. Como isso ainda está distante, é importante que cada
professor programe em uma de suas primeiras aulas uma visita com os alunos ao
“laboratório de informática”, a uma sala de aula com micros suficientes
conectados à Internet. Nessa aula (uma ou duas) o professor pode orientá-los
a fazer pesquisa na Internet, a encontrar os materiais mais significativos para
a área de conhecimento que ele vai trabalhar com os alunos; para que aprendam
a distinguir informações relevantes de informações sem referência. Ensinar
a pesquisar na WEB ajuda muito aos alunos na realização de atividades
virtuais depois, a sentir-se seguros na pesquisa individual e grupal.
Outra atividade importante nesse momento é a
capacitação para o uso das tecnologias necessárias para acompanhar o curso
em seus momentos virtuais: conhecer a plataforma virtual, as ferramentas, como
se coloca material, como se enviam atividades, como se participa num fórum,
num chat, tirar dúvidas técnicas. Esse contato com o laboratório é fundamental
porque há alunos pouco familiarizados com essas novas tecnologias e para que
todos tenham uma informação comum sobre as ferramentas, sobre como pesquisar
e sobre os materiais virtuais do curso.
Tudo isto pressupõe que os professores foram
capacitados antes para fazer esse trabalho didático com os alunos no
laboratório e nos ambientes virtuais de aprendizagem (o que muitas vezes não
acontece).
Mesmo numa escola conectada totalmente em rede,
o laboratório pode ser o espaço da multimídia, da integração das
tecnologias audiovisuais, do acesso a programas mais complexos que exigem mais
dos equipamentos, espaço da edição digital, da multiprodução.
3) A utilização de ambientes virtuais de
aprendizagem
Os alunos já se conhecem, já tem as
informações básicas de como pesquisar e de como utilizar os ambientes
virtuais de aprendizagem. Agora já podem iniciar a parte a distância do curso,
combinando momentos em sala de aula com atividades de pesquisa, comunicação e
produção a distância, individuais, em pequenos grupos e todos juntos1.
O professor precisa hoje adquirir a
competência da gestão dos tempos a distância combinados com o presencial. O
que vale a pena fazer pela Internet que ajuda a melhorar a aprendizagem, que
mantém a motivação, que traz novas experiências para a classe, que
enriquece o repertório do grupo.
Existem ambientes virtuais simples (como por
exemplo as páginas de grupos) e existem ambientes complexos (plataformas
virtuais integradas). Existem ambientes gratuitos (como o Moodle e o Teleduc) e
ambientes virtuais pagos (como o Blackboard). Existem ambientes de código
fechado (gratuitos ou pagos, nos quais não se pode mexer no código-fonte) ou
de código aberto (que permitem modificar o programa, como o Moodle2).
Estes ambientes virtuais incorporam cada vez
mais recursos de comunicação em tempo real e off line, de publicação de
materiais impressos, vídeos, etc. Recursos de edição on- line: professores e
alunos podem compartilhar idéias, modificar textos, comentá-los. Podem fazer
discussões organizadas por tópicos (off line) e fazer discussões ao vivo,
com som, imagem e texto. Os ambientes de aprendizagem se integram aos programas
de gestão acadêmica e financeira. Com a mesma senha os alunos acessam seu
histórico escolar, seus pagamentos, seus cursos. Tudo se integra cada vez
mais; tudo fala com tudo e com todos.
Os ambientes virtuais complementam o que
fazemos em sala de aula. O professor e os alunos têm menos aulas presenciais e
mais atividades a distância: podem ser só algumas aulas ou termos cursos
totalmente on-line. Nos cursos presenciais teremos uma parte das aulas a
distância, os chamados cursos semi-presenciais e precisaremos aprender a
gerenciar e organizar atividades que se encaixem em cada momento do processo e
que dialoguem e complementem o que estamos fazendo na sala de aula.
Creio que há três campos importantes para as
atividades virtuais: o da pesquisa, o da comunicação e o da
produção-divulgação. A pesquisa individual de temas, experiências,
projetos, textos. A comunicação pode realizar debates off e on-line sobre
esses temas e experiências pesquisados. Já a produção deve divulgar os
resultados no formato multimídia, hipertextual, “linkada” e publicar as conclusões
para os colegas e, eventualmente, para a comunidade externa ao curso.3
É fundamental hoje pensar o currículo de cada
curso como um todo, e planejar o tempo de presença física em sala de aula e o
tempo de aprendizagem virtual. A maior parte das disciplinas pode utilizar, ao
menos parcialmente, atividades a distância. Algumas que exigem menos
laboratório ou estar juntos fisicamente podem ter uma carga maior de
atividades e tempo virtuais. Podemos ter disciplinas totalmente a distância e
outras com mais carga presencial. Essas características marcam o modelo
semi-presencial que constitui uma das tendências mais fortes na educação em
todos os níveis, principalmente no superior.
A flexibilização de gestão de tempo,
espaços e atividades é necessária, principalmente no ensino superior ainda
tão engessado, burocratizado e confinado à monotonia da fala do professor num
único espaço que é o da sala de aula.
4) Inserção em ambientes experimentais,
profissionais e culturais
A escola pode estender-se fisicamente até os
limites da cidade e virtualmente até os limites do universo. A escola e a
universidade podem integrar os espaços significativos da cidade: museus,
centros culturais, cinemas, teatros, parques, praças, ateliês, centros esportivos,
centros comerciais, centros produtivos, entre outros. Podem organizar também
os currículos com atividades profissionais ou sociais, com apoio da
comunidade.
Os cursos de formação, os de longa duração,
como os de graduação, precisam ampliar o conceito de integração de
reflexão e ação, teoria e prática, sem confinar essa integração somente
ao estágio, no fim do curso. Todo o currículo pode ser pensando em inserir os
alunos em ambientes próximos da realidade que ele estuda, para que possam
sentir na prática o que aprendem na teoria e trazer experiências, cases,
projetos do cotidiano para a classe. Em algumas áreas, como administração,
engenharia, parece mais fácil e evidente essa relação, mas é importante que
aconteça em todos os cursos e em todas as etapas do processo de aprendizagem,
levando em consideração as peculiaridades de cada um.
Se os alunos fazem pontes entre o que aprendem
intelectualmente e as situações reais, experimentais, profissionais ligadas
aos seus estudos, a aprendizagem será mais significativa, viva, enriquecedora.
As universidades e os professores precisam organizar nos seus currículos e
cursos atividades integradoras da prática com a teoria, do compreender com o
vivenciar, o fazer e o refletir, de forma sistemática, presencial e
virtualmente, em todas as áreas e ao longo de todo o curso.
A escola e a universidade podem integrar-se com
os espaços culturais e profissionais da cidade (museus, teatros, quadras
esportivas, parques, praças, ateliês, fábricas, cinemas, centros culturais)
e assim ampliar sua interação, o seu currículo, suas práticas, sua
inserção social. É importante integrar as experiências individuais de Ongs,
de empresas, de entidades religiosas e de classe com a educação formal. O
governo pode apoiar as melhores práticas e fazer com que façam parte de
cursos reconhecidos, de escolas oficiais. “Não basta oferecer boa escola: é
preciso, além de envolver e qualificar as famílias, acionar as diferentes
esferas do governo (saúde, geração de renda, esporte, saúde) e transformar
toda a cidade em espaços educativos, tirando proveito dos cinemas, teatros,
parques, empresas, museus”.4
Podemos aproveitar melhor a aprendizagem
prévia de cada aluno, principalmente do adulto. Fazer programas especiais para
profissionais que precisam de determinadas certificações.
O currículo pode alternar etapas na
universidade e em atividades profissionais desde o começo; pode prever
parcerias de práticas, integradas a reflexões na universidade. Isso já
existe hoje, mas ainda é muito complicada a forma de gerenciar essas
situações diferenciadas.
O currículo pode ser “negociado” entre a
universidade e alunos mais maduros. Cada aluno deveria ter um professor
orientador, para decidir em cada etapa, em conjunto, o que é melhor para o
estudante. No modelo atual, massificador, essa proposta é ingênua, mas é
possível viabilizá-la em instituições sérias com projetos pedagógicos
avançados.
Por outro lado, na educação básica, quanto
mais as escolas se inserem na comunidade, mais todos ganham: alunos,
professores e a própria comunidade. Hoje temos muitas iniciativas em todo o
Brasil, de escolas abertas para a comunidade, que procuram as competências no
bairro para que os alunos sejam beneficiados com contato, visitas, palestras,
aprendizagem prática. Mas ainda são projetos pontuais. A maior parte das
escolas permanece bastante distante da inserção com a comunidade.
1 É interessante o trabalho de CHRYSOS,
Adonys. La universidad semi-presencial: una experiencia de colaboración
internacional. Disponível em: http://www.unrc.edu.ar/publicar/cde/Chrysos.htm.
2 O Moodle é um dos ambientes virtuais que
mais crescem hoje por ser livre, feito de forma compartilhada e de código
aberto. Mais informações podem ser obtidas em:
http://moodle.org/course/view.php?id=35
3 Norma SCAGNOLI. El aula virtual: usos y
elementos que la componen. Urbana,Universidad de Illinois USA, Enero 2, 2001.
Disponível em <http://www.edudistan.com/ponencias/Norma%20Scagnoli.htm>.
As tecnologias como apoio à pesquisa, à comunicação e à divulgação
estão mais explicitadas nos tópicos seguintes, neste mesmo capítulo.
4 Gilberto DIMENSTEIN. A escola dos sonhos. In
http://aprendiz.uol.com.br/content.view.action?uuid=2fb6c13e0af47010014d5bc9e37f78c
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