quarta-feira, 22 de maio de 2013

A AMÉRICA LATINA, O BRASIL E A GUERRA FRIA


A AMÉRICA LATINA, O BRASIL E A GUERRA FRIA

Alguns meses antes da rendição da Alemanha, os Estados Unidos apressaram-se em contatar os paises latino-americanos, com o objetivo de mantê-los sob sua área de influência.

Em 03 de março de 1945, representantes dos paises latino-americanos e dos Estados Unidos assinaram, na Cidade do México, a Ata de Chapultepec, um documento que nada mais era senão a ampliação da Doutrina Monroe de 1823.

A Doutrina Monroe foi uma declaração que reúne os princípios da política externa dos Estados Unidos com relação aos direitos e às atividades das potências européias no continente americano, exposta pelo presidente James Monroe em sua visita anual ao Congresso dos Estados Unidos, em dezembro de 1823. Chegou a ser a base da política aplicada pelos Estados Unidos em relação à América Latina. Não foi respaldada por nenhuma legislação aprovada pelo Congresso nem ratificada no direito internacional, razão pela qual foi inicialmente declarada como uma simples declaração política. Quando sua aplicação e popularidade aumentaram nos Estados Unidos, a partir de 1845, foi alçada à categoria de princípio, sendo especificamente denominada de Doutrina Monroe.

Monroe afirmou em seus dois discursos mais relevantes que as potências européias não podiam continuar colonizando o continente americano e frisou que não deveriam intervir nos assuntos das recentemente emancipadas repúblicas latino-americanas. Opôs-se a qualquer tentativa que os estados europeus viessem a fazer no sentido de imporem monarquias nas nações americanas independentes, mas acrescentou que os Estados Unidos não empreenderiam nenhuma ação nas colônias européias existentes, nem na própria Europa. Esse último ponto confirmava as idéias expostas por George Washington em seu discurso de 1796, no qual recomendava encarecidamente que os Estados Unidos não fizessem complicadas alianças em política externa.

Ao marcar desse modo a diferença entre a Europa e a América, Monroe sublinhava a existência de alguns interesses americanos e, mais concretamente, dos Estados Unidos. Renegou as monarquias européias como sistema político.

A Ata de Chapultepec estabeleceu que qualquer ataque ao território ou à soberania de qualquer país americano será revidado pelas forças conjuntas de todas.

Nos meses de agosto e setembro de 1947, em pleno ambiente de guerra fria, os países americanos voltaram a se reunir na conferência para a manutenção da paz e da segurança no continente, também conhecida como conferência da Quitandinha (famoso hotel  na cidade de Petrópolis ). Aí foi criado o Tiar (Tratado Interamericano de Assistência Recíproca ), também conhecido como pacto do Rio de Janeiro. Esse tratado, na verdade, foi a reafirmação da Ata de Chapultepec, pois estabelecia que:

A Ata de Chapultepec foi um acordo firmado no castelo de Chapultepec (cidade do México), pela Conferência Interamericana sobre os Problemas da Guerra e da Paz, que se realizou entre 21 de fevereiro e 8 de março de 1945. Participaram todos os países membros da União Pan-americana, que acordaram aplicar uma política de mútua defesa e solidariedade.

“ Um ataque armado por parte de qualquer estado contra um estado americano será considerado como um ataque a todos os estados americanos, e cada um destes é colocado na obrigação de concorrer para a resistência ao ataque”.

Antes de assinar o Tiar, o presidente Truman dos Estados Unidos, anunciou seu plano de uniformizar os armamentos dos exércitos latino-americanos e de colocar seu país à disposição das nações do continente para treinar suas tropas militares.

O Tiar foi um tratado assinado no Rio de Janeiro, em 1947, pelos estados americanos. O tratado determinou que qualquer conflito que surgisse deveria ser discutido entre os signatários antes de se recorrer ao Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Sua principal resolução, porém, foi a da solidariedade continental ante um ataque dirigido contra qualquer de seus membros, ato que seria considerado agressão aos demais.

Dessa forma, foi definida uma zona de segurança continental que ia do pólo Norte ao pólo Sul. O tratado, que desenvolveu a doutrina definida na Conferência do Rio de Janeiro (1942), que levou o Brasil a participar da guerra contra o Eixo, dirigia-se à época contra a União Soviética, pois já se iniciara a Guerra Fria.

Conhecendo um pouco a história das relações entre os Estados Unidos e os países latino-americanos desde o século passado, percebe-se que na declaração de Truman havia pelo menos dois interesses encobertos:

  1˚ ) criar uma dependência dos países latinos americanos em relação aos Estados Unidos no plano militar (antes da guerra, as forças militares latino-americanas utilizavam como modelo as forças francesas ou alemãs); e  
                                                                                                                       
2˚ ) vender os enormes estoques de armamentos que haviam sobrado da Segunda Guerra Mundial.

Sempre considerando que a União Soviética e o socialismo eram sérias ameaças para o mundo, os Estados Unidos transformaram a IX Conferência Interamericana, realizada na cidade de Bogotá (Colômbia), em 1948, num fórum de discussões e condenações do socialismo e dos partidos comunistas.

Nessa conferência de 1948 foi fundado a  OEA,  um organismo que,  sob tutela, ou orientação, dos Estados Unidos, representava a “unidade do continente e o tribunal onde deveriam ser discutidos os problemas entre os países americanos”.

Frutos da Guerra Fria, o Tiar e a OEA mostram que a principal preocupação dos Estados Unidos era não perder sua área de influência no continente, e não a defesa dos interesses dos signatários.
Um bom exemplo disso foi a Guerra das Malvinas. Em 1982, a Argentina invadiu as ilhas Malvinas ou Falkland, no Atlântico Sul, depois de muito reivindicar a posse dessas ilhas, que permanecem sob o domínio inglês. A Inglaterra reagiu e, no decorrer da guerra, satélites artificiais dos Estados Unidos forneceram a posição das tropas e navios argentinos aos ingleses, que venceram a Argentina.

Com essa atitude, os Estados Unidos desconsideraram os termos do Tiar. Em vista disso, é o caso de se perguntar: qual a validade do Tiar?  E da OEA?


2. A Doutrina Truman de certa forma resgatou a Doutrina Monroe

Em 1823, o presidente James Monroe, dos Estados Unidos , lançou a doutrina que leva o seu nome. Baseada no princípio”A América para os americanos”, essa doutrina defendia que os Estados Unidos, em nome de sua segurança, não poderam permitir que um país europeu estabelecesse domínio sobre qualquer território americano.

Por que nasceu essa doutrina?

Na época, os países da América estavam se libertando de suas metrópoles (Espanha e Portugal), isto é, obtendo independência política. A França,  a Inglaterra e outros países europeus tinham interesse em se apoderar dos países americanos. Portanto, a Doutrina Monroe era uma clara advertência a esses países para que esquecessem suas pretensões, pois a América já tinha “donos”  os Estados Unidos. Vê-se, assim, que desde 1823 os Estados Unidos procuravam transformar os países americanos em sua área de influência política e econômica. E isso perdura.

Ao estabelecer uma política que visava conter o avanço do socialismo através de intervenção direta ou indireta a Doutrina Truman se assemelhou à Monroe, pois esta, como já foi assinalado, foi criada para assegurar a hegemonia dos Estados Unidos sobre os países latino-americanos.

“A decorrência prática mais imediata da Doutrina Truman foi o Plano Marshall. Instrumento econômico e financeiro de cristalização da área de influência americana na Europa Ocidental e tentativa de estabilização da economia européia ocidental, ele consubstanciou agressivamente a noção de contenção.

Nos anos do imediato pós-guerra, a Europa atravessava uma profunda crise econômica, dramatizada pelo racionamento de alimentos e energia, pelo crescimento do desemprego e queda vertiginosa das exportações. (…) A influência dos partidos de esquerda aumentava paralelamente ao agravamento da recessão.

Em junho de 1947, o secretário de Estado americano George Marshall lança as idéias básicas do Plano. Ele diagnosticava no desequilíbrio das trocas comerciais EUA-Europa e na conseqüente carência européia de dólares a fonte principal da crise econômica. Receitava um ambicioso programa de transferência de dólares de um lado para o outro do Atlântico Norte, através da concessão de fundos, créditos e suprimentos materiais a juros irrisórios.

O Plano, proposto a todos os países europeus e à URSS, previa estratégias econômicas continentais que teriam como resultado a recuperação da atividade econômica européia, a retomada de trocas equilibradas com os EUA e o retorno aos antigos fluxos comerciais intra-europeus, caracterizados pela troca de manufaturados do oeste por produtos agrícolas do leste. Além de consolidar o capitalismo na Europa Ocidental, o horizonte do Plano previa a reintegração da faixa de segurança soviética do leste na economia capitalista mundializada.

Temerosa da invasão da frágil economia do leste europeu por uma enxurrada de dólares (e dos efeitos políticos desse cenário), a URSS retirou-se das negociações do Plano no mês de julho. Os países da Europa Oriental, não sem grandes hesitações, seguiram a decisão soviética.

Em abril de 1948, foram assinados pelo presidente Truman os protocolos finais do Plano, envolvendo fundos e créditos no valor total de dezessete bilhões de dólares destinados a dezesseis países europeus, principalmente a Inglaterra, a França, a Itália e a Alemanha Ocidental.

O Plano Marshall foi o conduto de realização do projeto geopolítico de reconstrução da Europa Ocidental capitalista, baseado na solidariedade política e complementaridade econômica com os Estados Unidos. De certa forma, a Comunidade Econômica Européia (CEE) tem as suas raízes nesse período, quando a Europa dos conflitos entre ambições nacionalistas e coloniais dá lugar a uma outra Europa, unida contra a "ameaça soviética" e integrada a um mercado mundial capitalista que tem como vértice os Estados Unidos.

A reação soviética ao Plano Marshall consistiu no fechamento econômico e na completa subordinação política de sua faixa de segurança no leste europeu.

Ao se retirar das negociações do Plano, Moscou recria a Internacional Comunista sob nova roupagem: no lugar do antigo Komintern, extinto em 1943, surge o Kominform, organização que reuniu sob o comando do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) os PCs da Europa Oriental, da Itália e da França. Em seguida, os governos provisórios de coligação do leste europeu são substituídos, um a um, por governos monolíticos e pró-soviéticos”.

(Fonte: Magnoli, Demétrio. O mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Ática, 1994, págs. 55-56.)

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